Construção de Estados: As Administrações Internacionais das Nações Unidas

O poder de administração das Nações Unidas foi aparentemente, até ao final do século XX, mais uma hipótese teórica que uma realidade na vida da Organização. Várias circunstâncias históricas alteraram num curto espaço de tempo essa perspectiva. Os vazios de poder criados pela queda do regime no Cambodja e a ocupação militar no Kosovo vieram impor à ONU uma nova responsabilidade: assumir temporariamente todos os poderes do Estado, lançando num espaço de tempo curto as bases para a criação de um novo poder legitimo.

O caso de Timor-Leste foi o maior dos desafios deste novo tipo. Tratava-se de criar, praticamente do nada, um aparelho de Estado, contando com um número reduzidíssimo de quadros e um território devastado pelas peturbações que precederam o fim da ocupação indonésia. Para nós portugueses, e naturalmente também para a Academia Portuguesa, o caso de Timor assumiu um interesse especial, por razões que não é necessário referir.

Acresce que, num caso que nos diz tanto como o de Timor-Leste um olhar português é sempre muito diferente de qualquer outro, razão pela qual a presente obra ficará certamente no acervo fundamental das publicações sobre este momento histórico.

O conjunto recente de experiências de state building, no qual o caso de Timor-Leste se insere, tem suscitado uma nova reflexão sobre aspectos do apoio ao desenvolvimento que há poucos anos não estavam na ordem do dia. Éo caso da ideia que ultimamente tem sido reiteradamente referida nos documentos publicados no âmbito da ONU de que sem Estado de Direito de pouco valem os apoios financeiros ao desenvolvimento económico. O Estado de Direito não é, contudo, algo que possa ser desligado de uma administração eficaz, dimensionada às possibilidades financeiras do Estado e condições objectivas que não tornem o aparelho administrativo e judicial refém da corrupção endémica que grassa em quase todo o Terceiro Mundo.

A administração transitória da ONU em Timor-Leste confrontou-se com todos estes problemas, como a autora desta obra tão vivamente descreve. De certa forma podemos concluir que experiências como a de Timor-Leste conduziram a um novo olhar sobre os problemas do desenvolvimento.